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segunda-feira, 23 de agosto de 2010

PIS E COFINS: cobrar do consumidor é ilegal (Atualizado 23/09/2010)

 

Clariane Leila Dallazen

Existe uma recente divergência doutrinária acerca da legalidade do repasse dos valores relativos ao PIS e CONFINS ao consumidor, considerando os preceitos legais e constitucionais que envolvem o assunto.

Para melhor compreendermos as teses que circundam o assunto, é preciso que saibamos com clareza as nuances desses tributos, principalmente no que se refere à sua forma de cobrança e o seu legitimado passivo.

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A DINÂMICA DO PIS E DO CONFINS

O PIS e o COFINS se caracterizam como contribuições sociais incidentes, originariamente, sobre o faturamento bruto da empresas, o que, com a EC n° 20/98, foi ampliado para que a incidência também recaísse sobre a receita bruta das empresas. Tal fato, para alguns autores, configuraria uma hipótese de bitributação, o que geraria uma inconstitucionalidade. No entanto, parece mais coerente considerarmos tal fato como um caso de bis in idem, em que existe a incidência dupla do tributo sobre o mesmo fato econômico (faturamento ou receita bruta mensal), condição não considerada inconstitucional, tendo em vista que a Carta Magna não estabeleceu um teto de tributação a esse título.

Essas contribuições sociais encontram-se previstas no art. 195 da CF/88, o qual, após a edição da EC n° 20/98, estabeleceu que a Seguridade Social deverá ser financiada por toda a sociedade, de maneira direita ou direta, e por receitas provenientes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além das contribuições oriundas dos empregadores (incidentes sobre o salário), o faturamento ou a receita e o lucro, tudo na forma da lei.

A contribuição relativa ao PIS foi instituída pela LC n° 7, de 7/12/1970, tendo como base de cálculo o faturamento bruto dos seis meses anteriores ao mês de ocorrência do fato gerador, ao que se denominava de PIS semestral. A sua alíquota inicial era de 0,15%, sendo que, a partir de 1974, passou para 0,50%. O Decreto-Lei n° 2.445/88, alterado pelo Decreto n° 2.449/88, foi quem instituiu o PIS mensal, cuja alíquota era de 0,65%, incidente sobre a receita bruta operacional.

Através da decisão proferida no RE n°. 148.754-RJ, ReI. Min. Carlos Velloso, JSTFLex 185/206, o STF declarou a inconstitucionalidade formal de ambos os Decretos-leis, sendo que, em decorrência disso, o Senado Federal baixou a Resolução n°. 49, de 9/10/95, suspendendo a execução das disposições legais supra citadas. Por meio disso, considerando a natureza declaratória daquela decisão da Corte Suprema, voltaram a vigorar as disposições da LC n°. 7/70, a qual cessou sua vigência apenas após o advento da MP n°. 1.212, de 28/11/1995, a qual estabeleceu a base de cálculo do PIS como sendo o faturamento mensal.

A MP n°. 1676, convertida na Lei n° 9.715, de 25/11/1998, veio definir o faturamento como sendo a receita bruta considerada pela legislação do imposto de renda, instituindo a alíquota de 0,65%. A MP n°. 66, convertida na Lei n° 10.637, de 30/12/2002, eliminou a sua incidência em cascata, porém majorou a alíquota para 1,65%.

Já no caso da COFINS, esta foi instituída pela LC n°. 70, de 30/12/1991, caracterizando-se como um sucedâneo do Finsocial, o qual foi declarado inconstitucional pela Suprema Corte. A sua base de cálculo era a receita bruta das vendas de mercadorias e serviços, incidindo à alíquota de 2%. A Lei n° 9.718, de 27/11/1998, alterou a base de cálculo para receita bruta, abarcando a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, além de majorar a alíquota para 3%.

Com base no exposto, pode-se inferir que ambas as contribuições, PIS e COFINS, tiveram a base de cálculo ampliada de faturamento bruto para receita bruta, fato que suscitou controvérsia doutrinária e jurisprudencial. Mas em que isso implica? Para compreendermos tal fato, é preciso que saibamos os conceitos de faturamento e de receita bruta.

Faturamento é o ato de faturar, isto é, incluir na fatura as mercadorias ou serviços vendidos. Fatura, por sua vez, é o documento em que se elenca as mercadorias vendidas, bem como sua quantidade, espécie, tipo, preço entre outros, bem como as condições para sua entrega ao comprador e o prazo de pagamento.

Tendo por base alguns precedentes jurisprudenciais (RE 150.755, RTJ 149/259 e REsp n°. 250277, ReI. Min. Franciulli Netto, DJ de 7-06-2004, p. 178), é possível compreendermos que o conceito de faturamento identifica-se com o conceito de receita bruta, antes do faturamento vem o auferimento de renda, sem o qual aquele não pode existir.

O estudioso Eduardo Marcial Ferreira Jardim, ao tratar do assunto, afirma que "o direito tributário tem utilizado a expressão, vez por outra, com a acepção de somatória das receitas, vale dizer, aquelas provenientes da atividade mercantil, acrescidas de receitas financeiras. Lembramos, por exemplo, que o faturamento representa a base de cálculo da contribuição social denominada Cofins, a qual incide na proporção de 2% em relação ao faturamento mensal das empresas" [1].

Não obstante a afirmação supra, deve-se ponderar que o conceito de receita bruta é mais amplo do que o de faturamento bruto, tendo em vista que aquele abrange as receitas não operacionais, tais como os rendimentos de alugueres e receitas financeiras representadas por juros, dividendos etc., isso de acordo com o entendimento prolatado pelo Plenário da Corte Suprema.

Feito esse apanhado geral acerca do histórico dos impostos que aqui se pretende analisar, abarcando-se inclusive aspectos referentes à sua base de cálculo e forma de apuração, passemos então à discussão das irregularidades que vem norteando a atitude das concessionárias de serviços de telecomunicações e energia elétrica, quando incluem no preço das tarifas, nas contas de telefone e luz dos consumidores, o valor que elas deveriam pagar a título de PIS e COFINS.

Não está se utilizando o faturamento como base para o pagamento, cálculo este que nunca poderia ser feito da forma que está atualmente, ou seja, na própria conta de telefone.

CONTAS DE TELEFÔNICAS: INCIDÊNCIA PIS E COFINS

Não há qualquer dúvida de que o repasse dos valores referentes ao PIS e COFINS aos consumidores por meio da cobrança em suas contas telefônicas tornam o serviço mais custoso a eles.

Todavia, o repasse desses valores é absolutamente incompatível
com o nosso ordenamento jurídico, pois o art. 150, I da CF/88 é claro ao enunciar que é vedado à União, Municípios, Estados e Distrito Federal exigir ou aumentar tributo sem prévia lei que o estabeleça. Além disso, temos o teor do art. 155, II, § 3°, de nossa Lei Maior, que assim estabelece a competência dos Estados e do Distrito Federal para instituir impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviços de transporte e comunicação. Referido artigo, em um de seus parágrafos preceitua que nenhum outros tributo poderá incidir sobre operações de energia elétrica e serviços de telecomunicação, à exceção do ITCMD e do ICMS.

Considerando esses dispositivos legais, nos parece absolutamente claro que o repasse do PIS e COFINS aos consumidores constitui-se em uma prática abusiva, pois a lei que os institui, atribui seu pagamento às empresas prestadoras do serviço, não aos seus consumidores. Nesse sentido, entende-se que a não há prévia lei que autorize o repasse desses tributos aos consumidores, havendo apenas uma omissão acerca de uma determinação legal expressa que proíba tal prática. Diante de tal deslize legislativo, as empresas de telefonia e energia elétrica, ardilosamente, repassam tais valores aos seus consumidores, como ocorre com o ICMS, mas com a diferença de que sobre esse não há irregularidades

Seguindo o raciocínio iniciado, a Constituição Federal ainda determina que ambos os impostos tenham como base de cálculo o faturamento das empresas, de acordo com a previsão constate do art. 195, II da CF/88.

Além dessa, considere-se também o teor do art. 2º da Lei n° 9.718, de 27/11/1998, que altera a legislação tributária federal, cuidando da matéria e enunciando ser, o PIS/PASEP e a COFINS devidas pelas pessoas jurídicas de direito privado, tendo como base de cálculo o seu faturamento.

Desconsiderando-se tais disposições legais, que claramente atribuem a responsabilidade pelo pagamento do PIS e COFINS às empresas prestadoras do serviço, o seu repasse continua a ser feito, numa política do "se der certo, deu", esperando, as concessionárias, que os consumidores não constatassem tal ilegalidade, ou, mesmo constatando, não reclamassem, por se tratarem de valores ínfimos no mês a mês, ou ainda que não quisessem se submeter às mazelas do sistema judiciário do país, aguardando uma decisão por anos, para receberem valores pequenos de restituição.

Essa prática das empresas tem como argumento fundamental a aplicação analógica da Lei Complementar 87/96 (Lei do ICMS), no entanto essa tem aplicabilidade específica para o ICMS, não sendo possível a sua ampliação para outros tributos que não ele.

O STJ já proferiu decisão, recentemente, afirmando ser ilegal a do PIS e COFINS nas contas de telefone (link do inteiro teor), segundo a qual “É indevido o repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica, por ausência de expressa e inequívoca previsão na lei.” e “Somente o ICMS, por expressa disposição legal, deve ser objeto de destaque e cobrança na fatura, repassando-se diretamente o ônus ao assinante. 9. O repasse indevido do PIS e da COFINS na fatura telefônica configura "prática abusiva" das concessionárias, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, pois viola os princípios da boa-fé objetiva e da transparência, valendo-se da "fraqueza ou ignorância do consumidor" (art. 39, IV, do CDC).[2]

Apesar de o acórdão falar apenas das contas de telefone, o mesmo se aplica às contas de luz, pois a prática das concessionárias de energia e a das telefone é a mesma: o repasse indevido aos consumidores de um tributo que é de sua responsabilidade exclusiva o pagamento.

No entanto, tal decisão não foi definitiva, pois recentemente o STJ pronunciou-se, por meio de decisão monocrática do ministro Humberto Martins, em sentido contrário, afirmando ser possível o repasse aos consumidores dos valores relativos ao PIS e COFINS. O entendimento do ministro Humberto Martins baseou-se em um precedente proferido pela primeira seção do STJ em junho de 2006, quando o Tribunal estabeleceu que as operadoras poderiam cobrar a assinatura básica de telefonia de seus consumidores. O precedente utilizado pelo ministro baseia-se em dois argumentos: de que a fórmula de cobrança estava devidamente estipulada no edital de licitação publicado em 1998 e de que as regras de cobrança são, de acordo com a Lei Geral de Telecomunicações de 1995, de responsabilidade da Anatel. O ministro Humberto Martins entendeu que o precedente se aplicava perfeitamente ao caso da exclusão do PIS/COFINS das faturas de telefonia e proferiu a decisão monocrática favorável à operadora.

Todavia, esta também não é uma decisão definitiva, pois ainda pende recurso sobre ela, sendo a nova decisão prevista para o segundo semestre deste ano. Aguardemos.


[1] Dicionário jurídico tributário. São Paulo: Dialética, 4° edição, 2003, p. 109.

[2] (REsp 1053778 / RS. RECURSO ESPECIAL 2008/0085668-8, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN. T2 - SEGUNDA TURMA. Julgamento: 09/09/2008. Publicação: DJe 30/09/2008).

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STJ julgou em 22/09/2010 legítimo o repasse de PIS e Cofins nas tarifas de energia elétrica

É legítimo o repasse às tarifas de energia elétrica, a serem pagas pelos consumidores, do valor correspondente ao pagamento da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), incidentes sobre o faturamento das empresas concessionárias.

A conclusão, unânime, é da 1ª Seção do STJ. O julgamento ocorrido ontem (22) seguiu o rito dos recursos repetitivos. Assim, o julgado passa a ter aplicação nas demais instâncias da Justiça brasileira.

No STJ, o recurso era do consumidor gaúcho Eder Girard, contra a Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica (CEEE D). A ação do consumidor tinha como objetivo o reconhecimento da ilegalidade do repasse às faturas de consumo de energia elétrica do custo correspondente ao recolhimento pelo Fisco do PIS e da Cofins. Ele pediu que fosse devolvido em dobro o valor indevidamente recolhido.

Em primeira instância, a ação foi julgada improcedente. Na 7ª Vara Cível de Porto Alegre, a sentença foi do juiz  Heráclito José de Oliveira Brito. 

O magistrado fundamentou  que "embora a parte ré seja a contribuinte fiscal responsável pelo pagamento das contribuições, impostos e taxas, nada impede que os custos inerentes da carga tributária sejam repassados aos consumidores, pois esse repasse se dá por mera transferência econômica, mantendo a parte ré como sujeita passiva da obrigação tributária, não havendo de forma alguma qualquer transferência de responsabilidade jurídica pelo pagamento do tributo".

O consumidor apelou, mas a 2ª Câmara Cível do TJRS manteve a sentença, ao entender que "o repasse é legítimo, pois autorizado pelo parágrafo 3º do artigo 9º da Lei nº. 8.987/1995". A decisão foi dos desembargadores Pedro Bossle (relator), Sandra Brisolara Medeiros e Denise Oliveira César.

O consumidor recorreu ao STJ. O ministro Teori Albino Zavascki, relator do recurso, decidiu submeter o caso ao regime do artigo 543-C do Código de Processo Civil, devido à relevância da questão e aos processos repetitivos sobre o mesmo tema em análise no STJ. Nos autos, manifestaram-se sobre a tese o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abrade).

Seguindo o voto do relator, a 1ª Seção entendeu que "a tese defendida pelo consumidor parte de um pressuposto equivocado, qual seja, o de atribuir à controvérsia uma natureza tributária, com o fisco de um lado e o contribuinte do outro".

Para o ministro Zavascki, "a relação que se estabelece é de consumo de serviço público, cujas fontes normativas são próprias, especiais e distintas da tributária".

De acordo com o ministro, "o que está em questão não é saber se o consumidor de energia elétrica pode ser alçado à condição de contribuinte do PIS e da Cofins - que a toda evidência não o é - mas sim a legitimidade da cobrança de uma tarifa cujo valor é estabelecido e controlado pela Administração Pública e no qual foi embutido o custo correspondente àqueles tributos devidos ao Fisco pela concessionária".

Em seu voto, o ministro ressaltou, ainda, o princípio contratual da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. O relator afirmou, ainda, que alteração na forma de cobrança beneficia o consumidor, pois trouxe a possibilidade de que seus valores sejam fiscalizados não apenas pela Aneel, mas por cada um dos consumidores, visto que passaram a ser cobrados de forma destacada nas suas faturas, a exemplo do que ocorre com o ICMS. (REsp nº 1185070 - com informações do STJ e da redação do Espaço Vital).

1 comentários:

Muito bom, até porque restavam muitas dúvidas quanto à instituição do PIS e da COFISN. Se me permitir, usarei a tese para as novas ações que estou movendo contra as Concessionárias de Energia Telefônica local. Mas não deixarei de citar a fonte em respeito ao autor e ética profissional. Parabéns!!!

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